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Logo após a circense sessão da Câmara dos Deputados, dia 17/04, li postagens de pessoas defensoras do impeachment, se arrogando como “heróis da pátria”, como se tivessem sido responsáveis por aquele ato. Não bastando isso, continuam se arrogando como heróis: “agora vamos Tirar Temer e Cunha”.

Mais uma vez, não enxergam um palmo adiante do seu nariz (ou do seu umbigo), não querendo perceber (ou percebendo até, mas ocultando) os poderosos interesses por trás do que aconteceu, especialmente um interesse maior: parar as investigações da Lava Jato, porque a operação extrapolou as intenções de seus autores de apenas punir um partido: o PT. A Operação transbordou e aí se inclui a mega-corrupção de Eduardo Cunha e o seu séquito de corruptos. O raciocínio dos pretensos “heróis” é: “vamos tirar um a um”. Mas só citam Temer e, sobretudo, Cunha, que faz com que os “heróis” engulam o próprio veneno. Esse é o começo do veneno.

 

Tirando os dois, acabaria a corrupção no Brasil? Só se a Globo decretar, varrendo para debaixo do tapete, inclusive, as suas falcatruas, entre elas, a de sonegar impostos. Estão lembrados de cartazes de adeptos de Aécio Neves na avenida Paulista? Diziam: “Sonegação não é corrupção”. Vamos recuperar o sentido da palavra corrupção: “efeito ou ato de corromper alguém ou algo, com a finalidade de obter vantagens em relação aos outros por meios considerados ilegais ou ilícitos. Etimologicamente, o termo “corrupção” surgiu a partir do latim corruptus, que significa o “ato de quebrar aos pedaços”, ou seja, decompor e deteriorar algo. A ação de corromper pode ser entendida também como o resultado de subornar, dando dinheiro ou presentes para alguém em troca de benefícios especiais de interesse próprio”. O que a Rede Globo (e outras) pretendeu (pretenderam)? Subornar o Governo para não pagar os impostos. Caso contrário – e foi o que aconteceu –, partir para uma campanha sórdida contra o Governo, ocultando os seus interesses.

Mas, voltando ao assunto de acabar com a corrupção, vamos fazer um cálculo elementar considerando que:

  • Apenas no Congresso, há mais de 100 nomes citados em corrupção;
  • Para cada processo, anos se arrastarão, haja visto o caso elementar de Cunha, sobre cujo processo o “ínclito” Joaquim Barbosa sentou em cima desde 2006;
  • Mesmo assim, imaginando, de repente, que um tsunami atingisse o STF e este resolvesse combater a corrupção, de fato, é só fazer as contas. Digamos, uma média bem por baixo de uns três anos por implicado considerando que os mais de 100 seriam todos analisados simultaneamente. O que é uma piada. Quanto tempo se gastaria?

A essas alturas, todos nós estaremos debaixo de sete palmos de terra há mais de séculos.

Então, vamos discutir: o que é mesmo um/a herói/heroína (não confundir com o outro significado)?

Do grego ρως, no latim heros, o termo é atribuído a uma figura/personagem de dimensão semidivina: reúne, a um só tempo, uma condição humana e uma condição que a transcende, por ser dotado de qualidades acima do ser humano comum: fé, coragem, força de vontade, determinação, paciência e outras. Daí a representação mítica grega do herói: um semideus, filho de um deus e uma humana ou vice-versa. Interessante pensar, também, que, ao longo da História da Humanidade, predominam heróis, poucas heroínas. No mundo contemporâneo, o significado de heroína que predomina, é outro: e sabe-se lá se tem essa denominação para, mais uma vez, desqualificar o gênero feminino.

Um herói tem ideais nobres e altruístas: liberdade, fraternidade, sacrifício, coragem, justiça, etc. Seus atos são sempre morais. Sua marca é a superação em circunstâncias excepcionais que a exijam, notadamente em casos de ameaça a uma comunidade/sociedade/cultura, de que são exemplos: Hércules, na Grécia; Viriato, entre os lusitanos/celtiberos na luta contra os romanos, assassinado por companheiros subornados por Roma; Joana D’Arc na França na guerra contra os ingleses; Zumbi, em defesa do quilombo dos Palmares; Sepé Tiaraju, líder dos Sete Povos das Missões, morto na guerra guaranítica contras portugueses e espanhóis. Daí o heroísmo e seus personagens figurarem no imaginário especialmente popular como exemplos. E daí, nestes termos, heróis populares terem sua memória reprimida pelos donos do poder. Tiradentes é caso típico: tanto foi suprimido do imaginário brasileiro, durante o Império brasileiro, porque lutou pela liberdade contra a realeza absolutista, que mesmo tentativas de restaurar sua memória, com a implantação da República, não conseguiram arraigá-lo. A população brasileira não sabe direito quem ele foi e o que fez. E os donos do poder continuam querendo apagá-lo de nossa memória.

Isto é o mínimo suficiente para voltarmos ao tema-título deste texto.

Que qualidades semidivinas se vislumbram nos defensores do impeachment/golpe?

Sobre seus reais autores, (burguesia-FIESP, grande mídia sonegadora de impostos, interesses norte-americanos), não é preciso gastar muita tinta. Que ideais nobres e altruístas estão defendendo senão os próprios interesses? Que defesa da comunidade estão empreendendo senão remover obstáculos para poderem continuar a explorá-la, dominá-la?

Sobre os iludidos pretensos autores da ação, ou seja, segmentos das classes médias, as mesmas questões: que ideais nobres e altruístas são esses? Que defesa da comunidade é esta? Pois, de uma evidência cristalina, são contra uma sociedade mais justa e humana, são a favor da manutenção de privilégios, são porta-vozes de preconceitos, discriminações, racismos e… tortura. Sobre a sua “salvação da pátria” contra a corrupção, com Cunha, Temer e os congressistas corruptos, esse “argumento” torna esse discurso inconsistente e vazio. Que atos morais estão praticando senão discursos e ações de ódio?

Volto à frase de Elis Regina: “Infeliz é o povo que precisa de heróis”.

Não precisamos de heróis individuais de excepcionais virtudes semidivinas. Os “heróis” populares foram de carne e osso, encarnaram comunidades, e devem servir de referenciais. Precisamos da junção das nossas forças humanas para a luta contínua por uma sociedade de direitos à igualdade, à fraternidade, à liberdade. As classes trabalhadoras brasileiras estão plenas de heróis anônimos, homens e mulheres, sujeitos defensores das diversidades, que têm milhares de histórias de superação cotidiana de suas adversas condições de vida. Gente comum, não lhes falta, no entanto, fé, coragem, força de vontade, determinação, paciência e outras qualidades.

Mas o que é preciso mesmo, neste país, são lideranças que expressem as necessidades e aspirações do povo comum, sem messianismos e poderes pretensamente divinos. Que entendam os trabalhadores e trabalhadoras como heróis de si mesmos.

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